
Alexandra Peixe dos Santos, mais conhecida como Xande dos Santos, militante LGBT e um dos organizadores da Parada Gay de Sampa, será a primeira mulher brasileira a passar pelo procedimento de mudança de sexo através do SUS. Este será a primeira cirurgia de transição female-to-male, ou no bom português, do sexo feminino para o masculino, o caso inverso já é realizado desde 2008.
A cirurgia está marcada para o início do mês de Abril, e do centro cirúrgico, Xande sairá sem útero, ovários e trompas. Depois, em data ainda a ser definida, passará pela retirada das mamas. Cada intervenção para retirada dos órgãos reprodutivos femininos (histerectomia total) e da mama (mastectomia) custará ao governo 717,90 reais e 462,80 reais respectivamente. Muito antes da cirurgia, o transexual deve passar por exames físicos e psicológico para saber se está apto à mudança, além de tomar alguns hormônios controlados.

“Desde criança, me entendo como menino”, diz Xande. Cedo, refutou o nome Alexandra: preferia Júnior. No primeiro dia de aula, foi parar na fila dos meninos. “Eu não entendia por que meu lugar era junto às meninas.” A escola, aliás, foi o principal palco do descompasso com o corpo nos primeiros anos. Nas aulas de educação física, queria compor o time de futebol – exclusividade masculina. “Era difícil até mesmo ir ao banheiro: a qual eu deveria ir?”, lembra.
A partir da adolescência, com as mudanças próprias da fase, tudo se complicou. Com um instrutor de uma academia de ginástica, teve acesso a hormônios masculinos, que engrossaram a voz, interromperam a menstruação e fizeram nascer pelos no rosto. Sem a devida orientação médica, acabou impondo mais dor ao corpo que queria transformar. “Tomei doses excessivas de hormônios e sofri dois derrames em menos de quinze dias”, conta.

Para a medicina, a cirurgia também é o desenlace de um drama. Em 1975, quando a primeira operação desse tipo veio a público, o médico responsável pelo feito, o cirurgião plástico Roberto Farina, chegou a ser condenado por lesão corporal grave, enquadrado no Código Penal Brasileiro. Quem quisesse se submeter ao procedimento, portanto, tinha de fazê-lo de forma clandestina, ou viajar a países com tradição no assunto, caso de Tailândia, Grã-Bretanha, Marrocos e Equador.
Mas a demanda pelas intervenções fez com que os profissionais de saúde paulatinamente repensassem suas posições. Em 2002, a prática deixou de ser experimental. Por fim, em 2008, o Ministério da Saúde deu ao tema status de questão de saúde pública, ao assumir os custos da cirurgia de mudança de sexo entre homens e, no final do ano passado, entre mulheres. É o fim de um ciclo.